sou quieta como folha de outono esquecida entre as páginas de um livro, sou definida e clara como o jarro com a bacia de ágata no canto do quarto - se tomada com cuidado, verto água límpida sobre as mãos para que se possa refrescar o rosto mas, se tocada por dedos bruscos num segundo me estilhaço em cacos, me esfarelo em poeira dourada.


.Caio Fernando Abreu

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Fobia das fobias





O ansioso tem direito a três fobias. Mais do que isso, é ambição e vira doença.



Eu mesmo é que determinei a medida para não depender de especialistas. Sofro por antecipação, o que me põe a ensaiar a cena para diminuir o sofrimento. Só que organizo eventos para os atos mais minúsculos, dobrando o martírio no fim das contas. Ao invés de sofrer na hora, sofro um dia inteiro pensando na hora que vou sofrer. O incômodo passageiro é um desconforto permanente. Banalidades do cotidiano geram desproporcional tremedeira. No intuito de preveni-las, eu me canso em hipóteses pessimistas, desculpas furadas e boicotes.


Carrego uma postura catastrófica. Sou dramático nas amenidades, sóbrio nas tragédias. Sinto o pânico no lugar errado e no momento errado. Serei tranquilo num deslizamento, numa enchente, num incêndio. Mas perderei a lisura ao não encontrar um livro em minha biblioteca. O fóbico não é o que usa uma lupa para ampliar o tamanho das coisas, mas fixa a lente com tamanha insistência que acaba queimando o que vê com o reflexo do sol.


Meus medos são modestos. Exótico é o Roberto Carlos, que somente executa curvas à direita ao volante (chegará sempre a Brasília).
Eu quero sentir o vento pela pele um pensamento me fará uma louca tempestade...

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

O último recurso




Quando fazemos tudo para que nos amem e não conseguimos, resta-nos um último recurso: não fazer mais nada. Por isso, digo, quando não obtivermos o amor, o afeto ou a ternura que havíamos solicitado, melhor será desistirmos e procurar mais adiante os sentimentos que nos negaram. Não fazer esforços inúteis, pois o amor nasce, ou não, espontaneamente, mas nunca por força de imposição. Às vezes, é inútil esforçar-se demais, nada se consegue;outras vezes, nada damos e o amor se rende aos nossos pés. Os sentimentos são sempre uma surpresa. Nunca foram uma caridade mendigada, uma compaixão ou um favor concedido. Quase sempre amamos a quem nos ama mal, e desprezamos quem melhor nos quer. Assim, repito, quando tivermos feito tudo para conseguir um amor, e falhado, resta-nos um só caminho...o de mais nada fazer.

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Do Encontro Marcado

"Há uma fresta em minha alma por onde a substância do que sou está sempre se escapando mas não vejo onde nem por quê. Depressa, não há tempo a perder. Também tenho o meu preço mas ninguém conseguirá me comprar, todo o dinheiro do mundo não basta, hei de fluir como um rio, dia e noite, nem que tenha de dormir de pé porque esta é a cama estreita que conduz ao reino dos céus."

Do encontro Marcado

"Calma. Não olhe. Não mexa. Não queira. Não estou dormindo, estou vigilante, hay que vigilar las tinieblas, capisca? [...], minha mágoa, minha pena, minha pluma, merecias morrer afogado, o barco te leva para longe, a praia está perdida, mas voltarás nem que tenhas de andar sobre as águas."

Do encontro marcado

"De tudo ficaram três coisas: a certeza de que ele estava sempre começando, a certeza de que era preciso continuar e a certeza de que seria interropido antes de terminar. Fazer da interrupção um caminho. Fazer da queda um passo de dança, do medo uma escada, do sono uma ponte, da procura um encontro."

Fernando Sabino

sábado, 11 de setembro de 2010

Salgueiro chorão com lágrimas escorrendo
Por que você chora e fica gemendo?
Será por que ele lhe deixou um dia?
Será por que ficar aqui não mais podia?
Em seus galhos ele se balançava
E ainda espera a alegria que aquele balançar lhe dava?
Em sua sombra abrigo ele encontrou
Imagina que seu sorriso jamais se apagou
Salgueiro chorão, pare de chorar
Há algo que poderá lhe consolar
Acha que a morte para sempre os separou?
Mas em seu coração para sempre ficou"


Vada Sultenfuss

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Ps:


"Amar não significa anular-se, desistir do eu, amoldar-se à idéia e semelhança do outro. Amar é entregar-se, é dádiva, ofertório, jamais um suicídio do ego. Isso diria eu à namorada, se namorada eu tivesse. Diria, também, que o amor exige um tantinho que seja de mistério, sedução, surpreza, encantamento, espanto, descoberta."